MPF investiga avaliação do piloto de Eduardo Campos feita nos EUA

MPF investiga avaliação do piloto de Eduardo Campos feita nos EUA

Americano conduziu o teste para pilotar modelo Cessna Citation 560 XL. Anac diz que procedimento de terceirização para empresa dos EUA é legal.

Check da Anac, em inglês, feito pelo piloto de  Eduardo Campos (Foto: Reprodução)
Check da Anac, em inglês, feito pelo piloto de
Eduardo Campos (Foto: Reprodução)

O Ministério Público Federal (MPF) investiga uma avaliação feita no exterior pelo piloto do ex-candidato à Presidência Eduardo Campos para voar com a aeronave americana Cessna Citation 560 XL no Brasil. Autorizado pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), um instrutor americano testou o piloto em um centro de treinamento nos Estados Unidos.

O MPF pediu à Anac que informe o motivo de autorizar um piloto americano, que não conhece as normas de aviação do Brasil, a avaliar um brasileiro.

Campos morreu em um acidente aéreo com esse modelo de avião em Santos (SP), no dia 13 de agosto. Outras seis pessoas morreram, entre elas o comandante da aeronave, Marcos Martins, e o copiloto Geraldo Magela Barbosa da Cunha. A aeronave caiu após tentar pousar na base aérea da cidade.


______continua após a publicidade_______

seguro


Segundo documento obtido pelo G1, Martins foi autorizado a voar com o modelo Cessna 560 XL no Brasil após avaliação feita em um simulador em 5 de outubro de 2013 em um centro de treinamento da empresa Flight Safety em Orlando, na Flórida. A ficha, no padrão oficial da Anac, está traduzida para o inglês.

A Anac confirma a autenticidade do check – nome dado ao teste anual que verifica se o piloto está apto a voar com o modelo – de Martins. Informou ainda que a Flight Safety tem “o credenciamento reconhecido pela agência para ministrar treinamentos e emitir um laudo técnico quanto à proficiência do piloto” desde setembro de 2011.

“No mínimo, esta ficha de check deveria ser homologada e, ao retornar ao país, sua autenticidade ser confirmada de alguma forma, como algum carimbo que diz que está ok”, afirma o procurador federal Thiago Lacerda Nobre, que investiga o acidente que matou Campos.

Cunha, copiloto do avião, fez o último check em 25 de maio de 2014 durante um voo entre os aeroportos de Varginha e Pampulha (MG). Ele foi avaliado por um militar da Aeronáutica que presta serviços para a Anac.

Segundo a legislação brasileira, cabe à Anac fiscalizar se os pilotos estão aptos a voar com o uso de “checadores” – profissionais contratados ou credenciados que avaliam a performance com base em critérios técnicos. No caso do comandante Martins, a Anac terceirizou o serviço através de uma parceria com a empresa americana.

O instrutor

O piloto de Eduardo Campos foi avaliado em Orlando por Garry Lee Allen, piloto e instrutor de Cessna nos EUA desde 2009. Conforme o cadastro dele na Administração Federal de Aviação (FAA na sigla em inglês), órgão americano que regula o setor, Lee tem 66 anos e mora em Debary, na Flórida.

Durante duas semanas, a reportagem tentou falar com ele em dois telefones residenciais na cidade, mas não conseguiu contato.

Allen é certificado nos EUA como piloto de linha aérea habilitado para Cessna 560 XL e Cessna 750 Citation, além de ND-262 (um avião naval de fabricação francesa) e Boeing-377. Em seu cadastro na FAA não consta que tenha autorização para atuar como examinador de pilotos em teste nos EUA. Conforme o órgão, nem sempre este dado é registrado.

“Estas pessoas que avaliam os pilotos brasileiros lá fora também deveriam ser avaliadas ou estarem credenciadas aqui em alguma forma de cadastro, que confirmaria serem verdadeiras as informações. A Anac precisa saber se esta pessoa existe e se ele atua nos EUA como examinador. Se ele tem esta mesma autorização lá, isso pode ser aceito aqui”, afirma o procurador, que ainda está levantando informações sobre o caso.

Até o momento, ele não encontrou irregularidades no fato do documento, que é de um órgão oficial brasileiro, estar escrito em inglês.

Segurança aérea

Jato Cessna de Eduardo Campos caiu em Santos em 13 de agosto (Foto: GloboNews)
Jato Cessna de Eduardo Campos caiu em Santos
em 13 de agosto (Foto: GloboNews)

Para o diretor da Associação dos Servidores da Anac (ASA) Luiz Tito Walker de Medeiros, o fato de um piloto brasileiro ser avaliado por um instrutor no exterior pode ocasionar problemas de segurança aérea brasileira.

“Sem a menor dúvida isso é irregular e inseguro, pois, mesmo que ele tivesse feito treinamento nos EUA, deveria ser aprovado por um inspetor brasileiro, que conhece os pré-requisitos de avaliação nacionais”, entende Medeiros.

“Como alguém que não é certificado como checador no Brasil pode fazer o check de um brasileiro? Independe da Anac saber ou não quem é esta pessoa, ele não foi submetido às avaliações nacionais e não conhece a legislação brasileira. Estão destruindo a qualidade do exame de proficiência, e acidentes podem acontecer por isso”, completa.

Um relatório técnico obtido pelo G1 (foto abaixo) mostra que, em 2010, durante o processo de decisão sobre a aprovação de examinadores em centros de treinamento nos EUA, a gerente de segurança operacional da Anac, Andréa Ferreira Motta, encaminhou o assunto ao superintendente de segurança operacional da agência, David da Costa Faria Neto. Ela recomendava que, antes de firmar o acordo, o governo consultasse o Ministério Público Federal “para análise do aspecto legal” do credenciamento.

Neto respondeu no despacho que, “levando-se em consideração que não há na nossa legislação impedimento para o credenciamento”, não via necessidade da consulta ao MPF.

Outro lado
Questionada sobre se sabia quem era o avaliador do piloto Marcos Martins e se ele realmente existia e tinha aptidões para o trabalho, a Anac respondeu que “o centro de treinamento utilizado pelo piloto foi certificado pela FAA para realização do treinamento ministrado e teve sua certificação reconhecida pela Anac”.

A agência entende que, como “o avaliador do piloto é examinador deste centro de treinamento tem, portanto, as condições de capacitação adequadas para a atividade atestadas pelo próprio centro e avaliadas e atestadas pela FAA, em consonância com o estabelecido nas normas da Anac”.

A agência diz que, conforme a Lei 11.182 de 2005, que criou o órgão, a Anac pode “credenciar pessoas físicas ou jurídicas para expedição de laudos, pareceres ou relatórios que demonstrem o cumprimento dos requisitos necessários à emissão de certificados ou atestados” e que só usa os laudos em seu processo de certificação.

A Anac não soube informar quantos pilotos brasileiros já tiveram o brevê expedido apenas com base em testes emitidos pela Flight Safety ou outros centros de treinamentos no exterior, mas afirmou que, atualmente, só 6,5% dos checks são feitos por inspetores pilotos da agência.

A Flight Safety disse que não poderia fornecer informações sobre os empregados e clientes e não confirmou se Garry Lee Allen é checador da empresa e desde quando presta serviços para a Anac. Segundo o centro, “muitos de seus treinamentos e simuladores são aprovados e qualificados por agências reguladoras ao redor do mundo, inclusive a Anac”.

Fonte: g1.globo.com



____________________publicidade___________________

seguro

anuncie