Força interior
André Rocha, campeão no lançamento de disco na classe F52 no Mundial de Atletismo Paraolímpico de Londres 2017 - Foto: Marcio Rodrigues/Mpix/CPB

Força interior

Campeão no lançamento de disco classe F 52 no Mundial de Atletismo Paraolímpico de Londres 2017, o paulista André Rocha acredita que o esporte salvou a sua vida

por Luiz Humberto Monteiro Pereira

humberto@autopress.com.br

Em 2005, o paulista André Rocha era policial militar. Durante uma perseguição, ao subir em um muro no encalço de um ladrão, se desequilibrou, caiu em um terreno baldio e lesionou a coluna. “Tenho lesão na medula e faço uso de um marcapasso medular para me ajudar na dor. Tenho dor crônica, tomei morfina por dois anos direto, tomei muitos medicamentos e caí numa depressão muito forte. Passei por três cirurgias em 14 dias e outras três posteriormente. O esporte me resgatou para vida”, avalia André. Doze anos depois, ele comemora sua medalha de ouro no lançamento de disco da classe F52, para atletas com membros inferiores sem movimentos, no Mundial de Atletismo Paraolímpico, em Londres. No dia 18 de julho, sagrou-se campeão ao atingir a marca de 23,80 metros – o novo recorde mundial da prova. “As pessoas não fazem ideia do que esse título significa para mim. Para quem chegou até a cogitar abandonar o esporte ou até ir para outra modalidade, alcançar algo como esse ouro não tem preço”, comemora o atleta de 40 anos, que é patrocinado pela Prefeitura de Taubaté, pelo Taubaté Shopping e pela Papelaria Iracema.


______continua após a publicidade_______

seguro


Esporte de Fato – Como o lançamento de disco surgiu na sua vida?

André Rocha – O meu contato com o paratletismo foi muito louco porque, quando eu procurei o treinador Guto Nascimento, eu só queria voltar a praticar uma atividade física, nem pensava em competição. No dia seguinte, tive meu primeiro contato com a cadeira de arremesso. Entre arremessos e lançamentos, fui me descobrindo nessa modalidade. Nela, me encontrei como atleta e trouxe de volta minha vida. Desde que iniciei no esporte paraolímpico, sempre pratiquei o atletismo. Aprendi a amar esse esporte e graças a Deus, os resultados têm sido muito satisfatórios. Estamos numa crescente e pretendo melhorar ainda mais minhas marcas. Sou policial militar reformado e atualmente me dedico 100% ao esporte e à minha família. Fora do esporte, meu outro prazer é estar com meus filhos, esposa e amigos.

Esporte de Fato – Ao longo de sua carreira como atleta, quais foram seus resultados mais expressivos?

André Rocha – Estou há quatro anos no esporte paraolímpico e venho numa crescente desde então. Meus resultados mais expressivos foram defendendo a seleção brasileira em âmbito civil e militar, em três ocasiões. O vice-campeonato nos Jogos Parapan-americanos em Toronto, no Canadá, e nos Jogos Mundiais Militares, na Coreia do Sul, no arremesso de peso, ambos em 2015 e, ser campeão no Mundial em Londres na Inglaterra no lançamento do disco esse ano, com quebra de recorde mundial, foram campeonatos e experiências únicas. Defender meu país entre os melhores atletas do mundo é sempre uma realização pessoal sem igual.

Esporte de Fato – Quais são seus ídolos dentro do atletismo?

André Rocha – O brasileiro Joaquim Cruz, nas provas de pista, e o alemão David Storm na prova de arremesso de peso. Já no atletismo paraolímpico, meus ídolos são Roseane do Santos, a Rosinha da classe F57 (arremesso e lançamento), e Ariosvaldo Parré da classe T53 (corrida de cadeira). Fugindo um pouco do atletismo, sempre gosto de assistir o nadador Daniel Dias.

Esporte de Fato – Você era o número 1 do mundo na classe F54 antes das Paraolimpíadas de 2016, mas só abriram a prova de arremesso de peso na classe F55, um grau de deficiência menor que a F54. Você chegou a disputar as seletivas na F55, mas não se classificou para as Paraolimpíadas do Rio. Como encarou esse revés?

André Rocha – Mesmo não abrindo a prova do arremesso de peso na minha classe nas Paraolimpiadas do Rio 2016, fui para a Alemanha juntamente com meu treinador Guto Nascimento e treinamos muito. Acreditei até o último instante que conseguiria entrar na classe acima da minha. Conseguimos quebrar o recorde mundial, mas não foi o suficiente para alcançar o índice da F55. Mesmo sabendo das dificuldades, acreditei que conseguiria. O baque foi muito grande por não poder defender o Brasil nas Paraolimpíadas no meu país. Chorei muito e foi complicado assimilar tudo isso. Mas levantamos a cabeça e seguimos em frente. Sou muito competitivo e essas frustrações só me fortalecem.

Esporte de Fato – Como vê a repercussão dos Jogos Rio 2016 para o esporte paraolímpico brasileiro?

André Rocha – A repercussão foi muito positiva. Muitas pessoas não imaginavam como seria uma competição paraolímpica e se surpreenderam com a capacidade de superação e força de vontade desses atletas. Infelizmente, o legado que deveria ser deixado com relação à estrutura não está sendo utilizado e muitos dos locais que foram utilizados nas Paraolimpiadas estão se degradando. Um investimento fantástico em estrutura foi deixado de lado. Isso é muito triste. Temos um Centro de Treinamento Paraolímpico em São Paulo, utilizado pela seleção brasileira e para os campeonatos nacionais, que é digno de elogios pela sua qualidade. Está entre os melhores do mundo. Disso sim, me orgulho. Mesmo com todo esse reconhecimento e crescimento do esporte paraolímpico, ainda falta muito apoio das empresas privadas. Todo atleta precisa de apoio durante esse ciclo de quatro anos para se preparar bem e chegar ainda mais forte nas competições.

Esporte de Fato – Esse ano, você foi reclassificado e está concorrendo na classe F52. Por que?

André Rocha – Há mais de dois anos sofro com uma lesão na coluna cervical, correndo o risco inclusive, de ter sequelas graves durante as competições. Eu tive a opção de operar no final de 2015, mas acreditei que conseguiria minha vaga as Paraolimpiadas do Rio 2016 e arrisquei. Mas, em julho de 2016, meu corpo não aguentou e fui obrigado a parar e fazer a cirurgia. Porém, com mais de dois anos com a lesão no nervo, mesmo a cirurgia sendo bem-sucedida, as sequelas foram inevitáveis e permanentes em membros superiores (mãos, punhos, dedos, cotovelos e braços). Não consigo sequer levantar o implemento de 4 kg o qual, um dia, fui recordista mundial. Eu sei que assusta um pouco pelo meu tamanho, mas o que difere as classes paraolímpicas é o grau da lesão e não o tamanho do atleta. As pessoas precisam procurar entender um pouco mais disso antes de fazer um julgamento. Atualmente, procuro me adaptar a essa nova classe, pois ainda tenho muitas dificuldades em vários aspectos. O que me diferencia em relação a outros talvez é que, não fico só me lamentando. Vou em busca dos meus objetivos independente das adversidades.

Esporte de Fato – Quais são as próximas competições que irá disputar?

André Rocha – Após Mundial de Londres, já começamos a nos planejar visando os Grand Prix internacionais de 2018. Acredito que o Open Brasil, o Open dos Estados Unidos e o Open Berlim serão nossos maiores objetivos para o próximo ano.

Esporte de Fato – O que diria a alguém que quisesse se iniciar no atletismo paraolímpico hoje?

André Rocha – Que não perdesse tempo e começasse a treinar. O esporte é a melhor ferramenta de inclusão que eu conheço, trabalha a disciplina, autoestima, companheirismo, interação social, aprender a lidar com frustrações, enfim, só trabalha coisas boas em nossas vidas. Independentemente da pessoa vir a ser um atleta de alto rendimento ou não, estar inserido nesse meio é algo de suma importância. Caso se identifique com uma modalidade, começará a sentir a adrenalina das competições que o esporte proporciona. Eu amo o atletismo.

Curta a página da coluna “Esporte de Fato” no Facebook em www.facebook.com/colunaesportedefato



____________________publicidade___________________

seguro

anuncie