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Como lidar com a raiva
“Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem” – Jesus (Mateus, 5:44)
Edição de junho/2017 – pág. 30
Todos queremos um mundo melhor, mas é importante refletir sobre como melhorar nossas vidas. A cultura privilegia o material, o concreto. Daí pensar-se que, para viver melhor, é preciso possuir bens: dinheiro, poder, prestígio, fama. Entretanto, há um aspecto importante, pouco considerado: saber conviver. Ninguém vive só; para se viver bem é necessário saber relacionar-se com os outros. Seja vizinho, patrão, empregado, colega de trabalho, ou mesmo um familiar. Estamos sempre interagindo. Para uma vida saudável, mais do que ter muitas coisas é importante saber lidar com as pessoas.
Somos pouco evoluídos, ainda. Na caminhada evolutiva, estamos mais próximos do ponto de partida, do que do da chegada. Os instintos primitivos ainda predominam sobre as qualidades nobres.
Egoísmo, orgulho, ambição, vaidade, ciúmes estão mais presentes em nós do que o altruísmo, a solidariedade, a tolerância, generosidade, perdão, amor. Mas estamos na lei do progresso e, embora lentamente, vamos caminhando para situação melhor. Evoluir é o plano de Deus para todos os seus filhos. Em vista disso, face à pequena compreensão que temos sobre as leis divinas, o mal parece mais forte do que o bem, a matéria ainda predomina sobre o Espírito. A situação se modificará à media que formos evoluindo.
No atual estágio evolutivo, são naturais os atritos, os choques de interesse, a competição, os desentendimentos. Surgem os insultos, a raiva, e outros “venenos da alma”. O que fazer?
Jesus nos ensina: “Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem”. Analisando esta recomendação, Allan Kardec considera: “(…) Geralmente nos equivocamos quanto ao sentido da palavra amor, aplicada a esta circunstância. Jesus não pretendia, ao dizer essas palavras, que se deva ter pelo inimigo, a mesma ternura que se tem por um irmão ou amigo. A ternura pressupõe confiança. Não se pode ter confiança naquele que se sabe que nos quer mal. Não se pode ter para com ele as efusões de amizade, desde que se sabe que é capaz de abusar delas” E mais adiante “Amar aos inimigos é não lhes ter ódio, nem rancor ou desejo de vingança. É não opor nenhum obstáculo à reconciliação. É estender-lhes a mão prestativa em caso de necessidade. É abster-nos, por atos e palavras de tudo o que possa prejudicá-los. É, enfim, pagar-lhes em tudo o mal com o bem, sem a intenção de humilhá-los” (1)
Para procedermos como falado acima, devemos aprender a lidar com o insulto e a raiva. A ofensa é produzida mais por quem recebe o insulto e o valoriza como tal, do que por aquele que o dirige. Chico Xavier ensinava “não devemos passar recibo” às provocações que recebemos, isto é, não considerar o insulto que nos é dirigido. Se a pessoa está saudável, equilibrada, bem no seu íntimo, se guarda convicção de que não é aquilo que o agressor diz, não será atingida pela provocação.
Certas árvores, açoitadas pelo vento, como são flexíveis, envergam e após passar a força destruidora, voltam ao normal. Outras são rígidas, não cedem. Com o impacto do vento quebram-se, em parte ou totalmente, e após a tempestade estão arrebentadas, destruídas. Quem recebe o insulto e não o valoriza como tal, é como a árvore flexível que “sabe” lidar com a força do vento. Gandhi, perguntado se havia perdoado aos inimigos, respondeu que não. E ante a admiração do repórter, esclareceu que nunca fora atingido pelos ataques dos adversários. Não tinha o que perdoar porque não fora ofendido.
Mas, se nos sentirmos atingidos, sentindo a raiva pelo ataque recebido, vale lembrar que isto é natural, devido a nossa pouca evolução. E o que fazer com a raiva? Não cultivá-la, não alimentar o ódio, o desejo de vingança. Não ficar monologando sobre a crueldade, as más qualidades que supomos no ofensor. Ele tem o direito de ser como é; não vamos modificá-lo. Mas ele é nosso irmão, filho do mesmo Pai, subordinado às mesmas leis que se encarregarão de ensiná-lo e transformá-lo; leis que também nos corrigem e nos facultam o aperfeiçoamento. Assim, a raiva, com o tempo, passará naturalmente, como o corpo físico que, machucado, ferido, se recompõe e volta ao estado normal.
Procedendo assim, poderemos não estar cumprindo, totalmente, o ensino de Jesus, mas estaremos a caminho para fazê-lo o mais breve possível.
1 KARDEC, Allan – O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. XI