Após atentado, retórica anti-imigrante incomoda brasileiros nos EUA

Após atentado, retórica anti-imigrante incomoda brasileiros nos EUA

Logo que os acusados pelo atentado a bomba em Boston – os irmãos Tsarnaev – foram identificados como sendo de origem chechena, a brasileira Renata Teodoro começou a observar o aparecimento de alguns comentários hostis a imigrantes nos perfis de alguns de seus amigos no Facebook.

Um deles veio de um ex-colega de escola americano. “Ele falou que por isso (por causa do atentado) é que precisavam parar a imigração para os Estados Unidos. Disse que o país não tinha de deixar entrar mais ninguém e que quem estivesse aqui sem documento devia ir embora”, contou Renata à BBC Brasil.

Moradora de Boston, com 25 anos de idade e 19 de Estados Unidos, Renata disse que não conseguiu resistir à provocação e respondeu ao amigo.


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“Eu disse que não tinha documento, e como é que eu faço?”, relatou. “Ele não sabia o que responder. Dizia: ‘Ah, eu entendo, mas por que que isso (atentados) fica acontecendo?’ Eu não sei, mas não são apenas as pessoas de outros países fazendo isso.”

Ameaça ‘doméstica’?

Desde que alguns senadores republicanos usaram os ataques a Boston para sugerir uma suspensão da reforma migratória em andamento no Congresso, na semana passada, dois debates paralelos se entrelaçaram, gerando confusão e incômodo em defensores da legalização dos estrangeiros: o debate sobre as origens do ataque em si e a discussão sobre o futuro da reforma.

O ataque que deixou três mortos e cerca de 250 feridos em Boston tem sido tratado – apesar das diferenças de escala – como o pior incidente em solo americano desde os atentados de 11 de setembro de 2001, que deixaram mais de 3 mil mortos.

Mas se aqueles, planejados e realizados pela rede extremista Al Qaeda, levaram o então presidente George W. Bush a modificar seus planos no campo migratório, desta vez o panorama é mais carregado de sutilezas.

Os primeiros interrogatórios do irmão caçula, Dzhokhar Tsarnaev, que permanece no hospital, apenas reafirmaram que os dois jovens agiram por conta própria e sem o apoio de nenhuma rede estrangeira.

Além disso, os dois filhos de pais que entraram nos EUA mediante asilo político já eram considerados, à primeira vista, americanos e integrados no país. Um já era cidadão naturalizado e outro havia recebido o direito de residir nos EUA, o chamado green card.

Essas razões levaram alguns especialista a considerar o ataque a Boston como um problema “doméstico”.

Em um artigo para o site da CNN, o especialista em segurança após os atentados de 11 de Setembro do Council on Foreign Relations, Edward Allen, explicou que as regras americanas de imigração e concessão de asilo político se baseiam em um rigoroso escrutínio do histórico dos candidatos.

Poderiam, portanto, indicar tendências perigosas em relação aos pais, mas “não fariam nada para nos proteger contra os filhos dos imigrantes que possam mais tarde se radicalizar”.

“Como a Grã-Bretanha depois dos atentados a bomba no metrô, em 2005, que foram realizados primordialmente por imigrantes jovens, de segunda geração, os EUA não podem mais pensar que este é apenas um problema estrangeiro”, escreveu Allen.

“O radicalismo pode encontrar terreno fértil (para crescer) tanto em casa como no exterior.”

‘Alarmismo’

Curiosamente, essa ideia – de que o radicalismo pode também crescer internamente – também tem servido de argumento para os republicanos que acreditam que a reforma migratória precisa ser acelerada a partir dos atentados de Boston.

Para os senadores John McCain (Arizona) e Lindsey Graham (Carolina do Sul), a lei permitirá às autoridades conhecer quem são os indocumentados que desejam permanecer nos EUA, além de identificar quem entra e sai do país, “uma função básica do governo que nosso sistema é incapaz de fazer hoje”.

Ativistas em favor da reforma migratória acreditam que os ataques de Boston têm pouco a ver com um projeto cujo objetivo principal é legalizar cerca de 11 milhões de estrangeiros indocumentados que vivem atualmente nos EUA – a maioria, possivelmente, já inserida e funcional na sociedade americana.

“É alarmismo a gente achar que (o atentado em Boston) vai provocar alguma mudança política no país ou na lei de imigração que está sendo discutida”, opinou o brasileiro Felipe Sousa-Rodríguez, líder no campo da imigração e diretor da organização Get Equal, na Flórida.

“Se você olhar quem está falando isso, são senadores imigrantes que já tinham mesmo uma posição anti-imigração. É uma minoria.”

O raciocínio dos senadores foi objeto de diversas críticas, inclusive do presidente da conferência dos bispos americana, o cardeal Timothy Dolan, de Nova York, que condenou o que chamou de “rotular todo um grupo de pessoas, uma vasta população de trabalhadores dedicados, sérios e virtuosos”.

“Rotulá-los, diminui-los por causa da ação má intencionada e trágica de duas pessoas é simplesmente ridículo”, afirmou o religioso. “É ilógico. Injusto.”

Panos quentes

Os nervos continuaram acirrados durante a segunda discussão da reforma migratória na Comissão de Justiça do Senado americano, nesta semana.

Acusado por um colega democrata de ter usado o atentado a Boston como “uma desculpa” para tentar desacelerar a passagem da lei, o senador republicano Chuck Grassley, de Iowa, saiu aos gritos de “Eu nunca disse isso! Eu nunca disse isso!”.

Enquanto a discussão continua entre os senadores, em caráter privado, a preocupação dos imigrantes é evitar que as divergências políticas transbordem para a vida normal e afetem o seu plano pessoal.

Desde o incidente no Facebook com seu colega de escola, Renata postou uma mensagem de “paz” no site social, pedindo aos amigos que, apesar de todos estarem “assustados, machucados e confusos”, “tomem cuidado” com o que escreverem sobre o tema.

“Vamos evitar tirar conclusões apressadas ou espalhar a falta de informação”, escreveu. “Eu posso não ter nascido aqui, mas esta ainda é minha casa.”

“Amo a cidade de Boston e as pessoas que moram nela. Quero protegê-la. Não tenho todas as respostas sobre como evitar que isto volte a acontecer aqui ou no resto do mundo. Mas sei que a resposta não é o ódio, a suspeita ou mais violência.”

Fonte: diariodepernambuco.com.br



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