Violência e corrupção impulsionam a fuga de famílias brasileiras

Seja para investimentos ou no intuito de escapar da violência o fato é que famílias estão optando em morar nos Estados Unidos. Com isso cresce o número de adeptos a uma nova escalada de tentativas no país evidenciando um novo perfil de brasileiro emigrante em reduto americano

Walther Alvarenga

Foto: Reprodução
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Na década dos anos oitenta uma debandada de brasileiros deixou o Brasil para tentar a sorte nos Estados Unidos. Cidadãos que sonhavam juntar dinheiro para comprar a casa própria ou acumular poupança para o estudo dos filhos. Uma série de motivos que levou o país a ocupar o topo do ranking de imigrantes que deixaram a pátria em busca de vida melhor no exterior. Mas os tempos agora são ou outros. E os compatriotas que hoje deixam o país para residir na Terra do Tio Sam têm propósitos mais do que justificáveis: escapar da violência e dar às costas para a corrupção e a impunidade de nossos governantes. Com isso, famílias desembarcam na Flórida, frequentemente, obstinadas em montar o seu próprio negócio e viver por aqui, distante de situações inconvenientes. É a chamada fuga pela proteção familiar.

Pode parecer equívoco quando se fala do Brasil, a sétima Economia do mundo, em fase de crescimento no mercado internacional, galgando o seu espaço no primeiro mundo. Um discurso que impressiona, mas que não condiz à realidade dos brasileiros, em sua maioria insatisfeitos, dispostos a dar um basta na onda de corrupção que assola o país e buscar segurança para os seus no exterior. E a cada ano, centenas de pessoas decidem abandonar seus empregos e vir para os Estados Unidos. Há neste contexto de escape voluntário o desejo de fazer dinheiro o suficiente para um dia voltar ao seu amado país, com economias adequadas para apenas visitar parentes, amigos e depois retomar a trajetória no exterior.


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especial3A empresária, Clotilde Neves Salgado, 47 anos, de Belo Horizonte, fechou a sua loja de conveniências na área central da capital mineira quando decidiu morar no exterior. “Comprei apartamento na Flórida e vou me mudar até o final do ano com as minhas filhas adolescentes – Kelly e Amanda. O Brasil atravessa uma fase de insegurança total. A criminalidade aumentou e nós, brasileiros, que pagamos impostos, não recebemos o devido respaldo do governo na questão de segurança. A minha loja foi assaltada então resolvi dar um basta. Temo pelo futuro de minhas filhas, portanto, optei em viver nos Estados Unidos”, desabafa.

O comerciante, Antonio Pacheco Rodrigues, do Guarujá – SP – quer viver nos Estados Unidos com a família e vem se preparando para isso. Uma decisão que levou cerca de dois anos para ser concretizada, depois de receber o apoio da esposa e dos filhos. Ele está finalizando a compra de uma casa em Fort Lauderdale, na Flórida, onde esteve a passeio, em 2012, e se identificou com a cidade. Clima bom, segurança e a possibilidades de abrir o seu negócio. “Qualquer pessoa em sã consciência quer segurança e um lugar bom para se viver. Quando estive na Flórida, visitei vários lugares, mas gostei de Fort Laudedale pelas praias ótimas para nadar, sol quase o ano inteiro e um clima idêntico ao do Brasil. A minha esposa também adorou e a sua opinião foi fundamental para que eu batesse o martelo”, conta com entusiasmo.

O motivo que pesou na decisão de Pacheco em deixar o Brasil, além das praias e climas adoráveis da Flórida, foi à insegurança do país, com os altos índices de criminalidade, assaltos e a impunidade de políticos corruptos. “Eu leio os jornais e fico aborrecido. As notícias são desanimadoras”, lamenta. “Temos uma terra maravilhosa, fértil, mas a irresponsabilidade de homens do poder é realmente insustentável. Eu tenho a minha família e quero que ela sobreviva a isso. Gosto do Brasil, mas chegou o momento de novas tentativas e desafios”, complementa.

O futuro dos filhos

Foto: Reprodução
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A cada semana, famílias chegam aos Estados Unidos, principalmente na Flórida, pelo clima similar ao Brasil, decididas a recomeçarem outra trajetória. Um perfil diferenciado daquele emigrante dos anos noventa, pois se trata de empresários, profissionais liberais, enfim, pessoas de um bom poder aquisitivo que adquiriram casas ou apartamentos antes de embarcarem. Um histórico de pais preocupados com o futuro dos filhos nas capitais brasileiras – emprego escasso e alvo de traficantes -, dispostos a investirem em negócios para manter uma renda compatível ao status no Brasil. Vale ressaltar que no Mapa da Violência, divulgado recentemente, os jovens e adolescentes são o alvo crucial. Segundo pesquisas, dados alarmantes.

O problema que mais preocupa o jovem brasileiro é a violência, mencionada por 43% dos entrevistados em pesquisa feita pela Secretaria Nacional de Juventude, da Secretaria-Geral da Presidência da República. A segunda maior preocupação é com o emprego ou a profissão, lembrado por 34% dos entrevistados, seguido pela saúde e pela educação. O estudo foi feito em abril e maio, antes das manifestações populares em todo o país.

Mas o problema que mais incomoda a juventude brasileira atualmente é a corrupção, citada por 67% dos entrevistados e listada no topo do ranking, como o que mais incomoda, por 37% dos jovens. O poder dos traficantes foi lembrado por 46% dos entrevistados; a desigualdade social por 42%, e o racismo e formas de discriminação foram apontados por 34% dos entrevistados, somando todas as menções.

Segundo pesquisa do instituto americano Pew Research Center mostra que 72% dos brasileiros estão insatisfeitos com a maneira como as coisas estão indo no país, uma alta em relação à pesquisa anterior, feita poucos dias antes das manifestações, quando percentual de insatisfeitos ficou em 55%. A inflação foi apontada por 85% das pessoas como o maior problema do país. Já 72% dos entrevistados reclamaram da falta de oportunidades de emprego.

As avaliações sobre a economia pioraram drasticamente ao longo de um ano. O percentual do que responderam que a economia está mal aumentou de 41% no ano passado para 67% neste ano. Já os que disseram que a economia está bem caiu de 59% para 32%. Muitos destacaram a violência (83%), a saúde (83%), a corrupção (78%) e as escolas de baixa qualidade (64%) como os principais problemas do Brasil. E isso tem sido fator agravante para a debandada de famílias do país.

Imobiliárias satisfeitas

Condomínio em Kissimmee - Foto: Reprodução
Condomínio em Kissimmee – Foto: Reprodução

E se houve o tempo das vacas magras, quando o setor imobiliário nos Estados Unidos despencou, lesando pessoas que acabaram perdendo imóveis, hoje o panorama é bem diferente. O índice satisfatório de clientes brasileiros comprando casas e apartamentos na Flórida aqueceu o mercado. E segundo investidores do setor, “é mais rentável comprar imóveis nos Estados Unidos, pois o investimento é garantido e satisfatório, ao invés de comprar bens no Brasil com o risco de roubos e prejuízos”, disse o engenheiro Ricardo Santos, da cidade de Poços de Caldas – MG – que consolidou a compra de casa em condomínio fechado em Orlando, para garantir segurança nas férias dos filhos no final do ano.

Há, inclusive, profissionais liberais que estão comprando casas e apartamentos na Flórida para investimento. O intuito é colocar o imóvel em imobiliária e alugá-lo para as famílias brasileiras que vêm fazer compras em Orlando. “Uma boa alternativa, pois o imóvel não fica fechado durante o ano e isso rende um bom dinheiro que poderá pagar os impostos e encargos de manutenção”, confirmou o advogado Fabiano Costa Lima, da cidade de São Paulo.

Pesquisa comprova que muitos investidores almejam comprar imóvel fora do Brasil. “Depois que o mundo ficou pequeno com a internet, as pessoas se veem mais livres para adquirir propriedades aqui e ali e não se sentem mais presas às próprias fronteiras. A internet globalizou não só a informação, mas o sonho de consumo”, comenta Cassia Ximenes, do Sindicato das Empresas do Mercado Imobiliário de Minas Gerais (Secovi-MG).

Fort Lauderdale - Foto: Wikimedia Commons
Fort Lauderdale – Foto: Wikimedia Commons

Na visão de Cássia, são vários os aspectos que chamam a atenção dos clientes interessados em investir nos Estados Unidos. Em primeiro lugar, ter um mix de investimentos imobiliários, com unidades comerciais, residenciais e agora no exterior. A rentabilidade também é bastante atrativa nessas localidades. “Orlando é uma cidade voltada para o turismo em que os imóveis são comercializados por diária, e não com aluguel mensal”, exemplifica. Além disso, a possibilidade de se hospedar na casa influencia na decisão. Cássia lembra apenas que os compradores não devem se aventurar sozinhos, pois a legislação norte-americana é diferente da brasileira.
“O proprietário ganha duas vezes: com a valorização do próprio imóvel e com a renda do aluguel”, destaca o chief executive officer (CEO) da empresa Temporada em Orlando, Wendel Ferrari. Depois de passar a lua de mel em um condomínio na cidade de Kissimmee, o empresário comprou um imóvel e usou a internet para anunciá-lo. Em quase três anos, somam-se 60 casas ofertadas pela empresa com sede em São Bernardo do Campo, interior de São Paulo, especializada em aluguel de casas próximas à Disney. O imóvel, que custou US$ 170 mil a Wendel, hoje vale US$ 220 mil.

Seja para investimentos ou com o intuito de escapar da violência brasileira, o fato é que famílias estão optando em morar fora do Brasil, dispostas a conquistarem um novo mercado de trabalho, além, óbvio, de oferecer tranquilidade aos filhos. Surpreendentemente, cresce o número de adeptos a uma nova escalada de tentativas nos Estados Unidos, evidenciando um novo perfil de brasileiro emigrante em reduto americano.



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