O empobrecimento de brasileiros na volta ao Brasil

Afinal, o porquê do arrependimento de emigrantes que retornaram para casa? À falta de planejamento nos investimentos e a irresponsabilidade de familiares teria sido à ponta do iceberg. O país teria se preparado para recebê-los?

Walther Alvarenga

5013233792_433743e318_oA volta maciça ao Brasil de emigrantes que residiram nos Estados Unidos foi surpreendente nos últimos anos. A debandada de brasileiros no período de 2009 a 2013 preocupou as autoridades das cidades mineiras de Governador Valadares e Poços de Caldas – onde o fluxo emigratório foi expressivo. Mas o que causou tantas reclamações e frustrações no caminho de volta? Faltou preparo dos órgãos competentes – Ministério das Relações Exteriores, prefeituras e secretaria do Trabalho e do Desenvolvimento – para receber e orientar os ilustres “visitantes”. Eles regressaram esperançosos, dispostos a abrir o próprio negócio, após a vida dura, enfrentando a neve e as altas temperaturas durante o verão, mas esbarraram em burocracias e na inércia dos governantes. E os cidadãos do mundo, que acreditavam na independência financeira, pecaram pela falta de planejamento nos respectivos investimentos, que resultaram em perdas e danos. O estrago financeiro foi tamanho que pessoas, inclusive, perderam até meio milhão de reais em um ano.

Outro adendo agravante para os recém-chegados foram às surpresas familiares. E neste contexto sombrio incluem-se esposas, maridos, pais e filhos que não souberam – ou não quiseram – aplicar o dinheiro recebido do exterior, frustrando os emigrantes. Fatos inacreditáveis foram colecionados ao longo de depoimentos prestados pelos brasileiros lesados, pegos de surpresa ao desembarcarem em reduto tupiniquim. “Amar quem está longe é muito fácil. O difícil é aceitá-los na volta ao lar”, desabafou Sebastião Honório de Freitas, 56 anos, da cidade de Bandeira do Sul – MG – que alega ter sido roubado pela esposa e pelos filhos.


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A cidade de Poços de Caldas, por exemplo, no Sul de Minas Gerais, beneficiada com os altos investimentos de emigrantes nos Estados Unidos, teve um crescimento demográfico considerável, pois bairros inteiros – de alto padrão – foram construídos com o suor dos trabalhadores “americanos”. Ruas, praças e prédios foram erguidos, transformando a estância das águas em um centro residencial confortável, nas áreas administradas pelos brasileiros no exterior.

Entretanto, a volta destes emigrantes empreendedores à cidade – cerca de 2.700 pessoas – foi traumática. A maioria buscou, sem sucesso, setores de planejamento – no caso a Secretaria do Trabalho e do Desenvolvimento – para orientar em seus novos investimentos, mas o tiro saiu pela culatra. Com isso, muita gente perdeu dinheiro com empreendimentos que nasceram falidos, devido à localização imprópria para o estilo de negócio e pela falta de conhecimento dos mesmos para administrar. “Investi 130 mil reais em um supermercado, mas o negócio faliu em três meses. Perdi o meu dinheiro, fiquei desanimado. Eu não sei mais o que fazer”, revelou José Carlos Medeiros, 62 anos, que viveu 14 anos em Mount Vernon – New York – com a esposa.

2317Já a brasileira Sônia Regina Farias, 47 anos, montou um salão de cabeleireiro na Rua Assis Figueiredo – área nobre de Poços de Caldas-, mas perdeu o investimento de 50 mil reais em um ano. Ela morou seis anos na cidade de Jacksonville, na Flórida, e quando retornou ao Brasil quis dar continuidade ao negócio que lhe rendera dinheiro nos Estados Unidos. “Eu não tive um planejamento adequado no Brasil. O aluguel onde montei o salão era muito alto, mas eu confiei nas clientes que eu tinha antes de ir para a América. Não deu certo. Muitas delas tinham se mudado, outras não apareceram então me senti a estranha no ninho. Resolvi fechar o salão antes de perder todo o meu dinheiro”, contou.

Para o dinâmico construtor José Carlos Silva, 34 anos, que comandava duas turmas nos Estados Unidos, que se revezada em trabalhos na construção civil – Boston – à volta ao Brasil o empobreceu, financeiramente. Ele tentou montar o seu negócio, ou seja, equipe de pedreiro e pintor para trabalhar nas construções no Sul de Minas, mas não deu certo. “Eu tive dificuldades para montar equipe de bons profissionais. O pessoal não queria trabalhar e quando recebia o pagamento não aparecia no serviço no dia seguinte. Tive prejuízos, então achei melhor parar com tudo”, explicou.

O pesadelo familiar

melhores locais para visitar outono4 pocos de caldasOutra ponta do iceberg – diria o lado obscuro da volta ao Brasil – foram as decepções familiares. Pessoas que trabalharam ininterruptamente nos Estados Unidos, enviando remessas de dinheiro para a compra de casa, terreno ou mesmo para o estudo dos filhos no Brasil, mas que se surpreenderam com a lamentável realidade. Ninguém – os responsáveis pela administração da verba – tinha feito absolutamente nada. Não havia imóveis ou mesmo poupança. A família fez barbárie com os investimentos.

Este foi o caso de Samuel Santos, de 42 anos, da cidade de Caldas – MG – que confiou à irmã mais velha o envio do seu dinheiro para o Brasil. Ela depositaria a verba em uma poupança para que no futuro o investimento fosse o suficiente para pagar a faculdade das filhas de Samuel. O acordo, infelizmente, não foi cumprido. “A minha surpresa foi quando descobri que não havia poupança coisa alguma. A minha irmã gastou todo o meu dinheiro sem me consultar. Trabalhei duro, durante sete anos”, relatou revoltado.

graça-sperabundanteO Jovem R. S. M (ele pediu para não divulgar o seu nome ), regressou para os Estados Unidos na última semana de setembro de 2013. Ele acreditou ter feito o seu pé de meia quando foi de New York para Minas – cidade de Botelhos -, há dois anos. Tinha confiado ao pai o dinheiro para a compra de um sítio, onde pretendia morar e se dedicar ao plantio batatas. Estava tudo certo. Entretanto, ao chegar a sua cidade o botelhense recebeu o impacto. Entrou em depressão e se afastou da família e dos amigos. Meses depois resolveu revelar o que de fato tinha ocorrido. “O meu pai comprou um sitio pequeno, com terreno acidentado, inadequado para plantação. Ele mandou as fotos do sítio para os Estados Unidos antes de fechar o negócio. Disse que a área era boa para plantar e me fez acreditar que estava fazendo um bom negócio. Nas fotografias o local era bem diferente, com área plana e maior. Ele me enganou. Fui tirar satisfação e ele me desacatou. Mais tarde eu soube que meu pai deu um belo apartamento de presente para a minha irmã, com o meu dinheiro, claro”.

Pasme o leitor, mas o drama vivido por Maria da Conceição, 64 anos, é abominável. Ela morou durante 24 anos nos Estados Unidos, trabalhando na cidade de White Plains – Condado de Westchester – com uma família americana. Neste período, mandou dinheiro para o único filho em Poços de Caldas –MG – para a compra de uma casa. O rapaz fez tudo certinho, sob a supervisão da mãe. Ele comprou uma bela casa, com piscina e a mobiliou. Durante este período, a mãe lhe enviou dinheiro para as suas despesas pessoais. Mas, ao regressar ao Brasil, um ano antes previsto, a senhora Conceição foi surpreendida com a notícia de que o filho havia se casado e que levara a nora e a sogra para viver na bela casa que comprara.

“O meu filho ficou aborrecido quando cheguei repentinamente dos Estados Unidos. A minha nora me tratou muito mal. Eles me cederam um quartinho, nos fundos da casa, para eu morar e pediram para que eu não interferisse nos assuntos da família. A casa dos meus sonhos, que eu lutei tanto para ter, estava ocupada por pessoas que me detestavam”, revelou Maria Conceição, magoada.

Empobrecimento de brasileiros

À volta ao Brasil para a maioria dos brasileiros representou um empobrecimento com a perda de dinheiro em investimentos escusos e pela falta de oportunidades no mercado de trabalho. A maioria que regressou disposta a trabalhar em empresas no Brasil tinha passado dos 40 anos de idade e acabou regelada ao “congelamento” devido à política brasileira: “passou dos 40 anos é considerado inadequado para o Mercado de Trabalho”. E não bastasse isso, a surpresa pelo descaso de familiares foi outro fator agravante, gerando no arrependimento de quem resolveu retomar o caminho de casa. E o discurso é quase que o mesmo: “Não valeu a pena”, alega a maioria.

Na opinião do economista mineiro, Paulo Gervásio Amarantes, o Brasil acabou se esquecendo dos brasileiros fora do país. Não se planejou adequadamente para oferecer toda a segurança. “Não temos no país um planejamento apropriado para receber e amparar os brasileiros. Houve promessas infundadas por parte do governo, inclusive, para se criar a Secretaria Nacional do Emigrante, mas a ideia não saiu do papel. Depois se falou na Secretaria do Emigrante em Minas Gerais, com os devidos mecanismos para sanar dúvidas na questão de investimentos no mercado de negócios. Até agora, nada aconteceu”, lembrou Gervásio.

Governador Valadares

Em contrapartida, a cidade de Governador Valadares fez a sua parte como pôde ao criar o “Centro de Integração do Emigrante” que atende às necessidades de emigrantes que retornaram à cidade e das respectivas famílias que convivem com a distância de entes queridos. O grande número de valadarenses que tem deixado os Estados Unidos e voltado à cidade natal, devido à queda do dólar e da repressão aos imigrantes ilegais, tem se beneficiando com a iniciativa do Centro de Integração.

A ideia é fruto de um convênio assinado em 2007 entre o diretor da Associação dos Parentes e Amigos dos Emigrantes do Brasil (Aspaemig-BR) e da Câmara Municipal, Paulinho Costa, e o superintendente regional da CEF, Marcelo Bonfim. E segundo a Prefeitura Municipal, 40 mil valadarenses vivem fora do país e mandam R$ 10 milhões todo ano para o município. E se, por exemplo, um emigrante queira saber para qual instituição ele deve mandar o dinheiro ou, ainda, como está à cotação do dólar, poderá ligar para o Centro de Integração.



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